quinta-feira, 12 de maio de 2016

Nábia - Parte IV

Nábia e o Cristianismo
Rio Nabão

Quando o cristianismo chega a uma determinada região e lá se estabelece, sua intenção é apagar os resquícios das religiões pagãs; isso não aconteceu apenas na Iberia, como em todos os locais em que ele se estabeleceu. Porém tal objetivo não é assim tão fácil, pois a fé não está apenas no espaço, mas na mentalidade das pessoas.

"Poderiam multiplicar-se os exemplos desta persistência, embora desvanecida, do antigo culto das águas nas tradições populares. As práticas rituais primitivas destas devoções religiosas ainda no século VI da era cristã eram conservadas integralmente entre muitas populações da Península, apesar da expansão do Cristianismo, pois sabemos, por exemplo, que S Martinho de Durine, na sua evangelização do território bracáreas condenava as superstições heréticas, arraigadas no povo, que continuava mantendo a crenças nas ninfas e noutras divindades do Panteão romano e dos anteriores cultos indígenas " (SANTOS JUNIOR, J.R & CARDOZO, Mário, 1953, p.57)

O culto a Nábia foi combatido por diversos lados. Era praxe nos montes construir templos cristãos sobre seus lugares de devoção, esconder os resquícios por meio da cristianização do espaço, fatos que a arqueologia traria à tona em seus achados; aras votivas foram encontradas na igreja São João do Campo e há possibilidade de que uma capela dedicada à virgem tenha sido construída em cima de um altar de devoção à Nábia em Penafiel.
Nas águas é que surge a figura da santa, Santa Iria de Tomar:

 "Segundo a lenda de Santa Iria, em 653, quando a jovem professa rezava próximo de Tomar, numa capela situada na margem do Nabão, terá sido morta e lançada ao rio, vindo o corpo a navegar até Santarém. Tratar-se-ia de uma freira do convento beneditino fundado em 640 por S. Frutuoso, bispo de Braga, na margem do Nabão? Ou, de facto, nunca passara de uma lenda incomprovada?
A poucos quilómetros de Tomar, e não longe do rio, há uma povoação que tomou o nome de uma santa, igualmente assassinada e atirada ao Nabão. Trata-se de Santa Cita, uma jovem freira, de época muito anterior à da outra mártir.
Poder-se-ia aceitar, inquestionavelmente, a existência destas duas virgens do martirológio cristão, como santas portuguesas, se não fossem as suas homónimas de regiões distantes com semelhante percurso hagiográfico. Pululam as santas Irena ou Irina, bizantina, grega e romana. Se atentarmos na Vitae de Santa Irina de Magedon, nas Balcãs, que a situa no ano de 305 e aponta o seu culto para o dia 5 de Abril (e aqui saliente-se a curiosa coincidência com a data do culto a Nabia, inscrita na ara de Marecos), constatamos que a santa, depois de torturada, é fechada num túmulo, e ao cabo de uns dias, quando o abrem, o corpo terá desaparecido, o que se torna uma situação muito idêntica ao da Iria peninsular!"(SOARES, Lina Maria, 2010, p.214)

A lenda da santa é a tomada do Rio Nabão pelo Cristianismo, é a tentativa de apagar os cultos das águas à Nábia, é tornar as águas culto à nova fé. Parte superior do formulário

De qualquer forma, as tentativas de apagar os cultos à Nábia não deram de todo certo, ou nem eu, nem outros, estaríamos falando dela hoje, pois nada na história da humanidade se apaga, só precisa ser relembrado; essa foi a idéia ao escrever sobre Nábia, pois ela ainda vive.
Fontes:

OLIVARES PEDREÑO, Juan Carlos - Los Dioses de la Hispânia Céltica– Madrid : Real Academia de la Historia : Universidad de Alicante, 2002.



SANTOS JUNIOR, J.R & CARDOZO, Mário - Ex- Votos às Ninfas em Portugal. Salamanca: Zephyrus - Revista de prehistoria y arqueología Vol. IV, 1953
SOARES, Lina Maria - Da Scallabis Romana a Sactarem: Espaços, Gentes e Lendas in: Espaços e Paisagens. Antiguidade Clássica e Heranças Contemporâneas. Vol. 3. História, Arqueologia e Arte, org. OLIVEIRA, Francisco et. all. Coimbra: Associação Portuguesa de Estudos Clássicos - APEC, 2010.

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